Ao longo destes 20 anos de profissão e também no decorrer de meus 53 anos de vida, tenho refletido muito sobre as experiências adquiridas nesta jornada em relação ao lugar social da mulher. Interessantemente e crescentemente, para minha alegria, as mulheres estão saindo de suas casas e ocupando lugares de destaque na vida laborativa e em todos os segmentos sociais. Atualmente vejo mulheres atuando com muito brilho nas empresas, no comércio, na ciência , nos esportes e percebo como elas são guerreiras, pois ainda são vistas com desconfiança pelo mercado e precisam ser muito boas no que fazem para conquistarem o respeito que merecem.
Historicamente fomos colocadas no lugar de objeto. Nosso corpo e nossa vida passaram, com o advento da propriedade privada , a ser um "bem" como as vacas e galinhas de terreiro do "senhor" da propriedade, com o objetivo de saber de quem eram os filhos varões para perpetuar o clã e garantir a defesa do território. Houve luta, e as mulheres perderam por conta da força física, o único item que nos coloca em posição de desvantagem. E desde então, estamos travando uma guerra intelectual em prol do respeito e da igualdade.
O acumulo de funções nos coloca em uma posição delicada no mercado de trabalho. Culturalmente a mulher ainda ocupa o lugar de "dona de casa" e "mãe". Ao que parece, mesmo que na prática tenhamos muitos homens "donos de casa" no aspecto de cuidar destes afazeres e "pais" no âmbito do cuidado com os filhos, a mercado enxerga ainda a mulher como uma profissional dividida. Isto faz com que tenhamos que "matar um leão" todos os dias para que gozemos de reconhecimento. Ainda ganhamos menos ocupando mesmas funções e entre a contratação de um homem e uma mulher, na maioria dos casos, a vaga será do homem, mesmo a mulher tendo um ótimo curriculum.
Por que isto acontece? Um dos aspectos é que ao engravidar a mulher tem por lei o direito de ficar em casa por mais tempo, enquanto que o homem não vai necessariamente com sua parceira ás consultas durante a gestação, o que faz com que a funcionária falte ao trabalho e leve o devido atestado e tão pouco este homem ficará 6 meses em casa cuidando do filho, o que mobilizará a empresa a ter que contratar e treinar um substituto para o período de ausência da profissional que acaba de ter um filho. Daí, mais fácil é ter um homem que não necessitará de tantas ausências. Algumas empresas, quando optam em contratar profissionais femininas, selecionam aquelas fora da faixa etária de procriação para que não corram o risco das licenças maternidade.
Enxergando o mercado de trabalho com o olhar capitalista, a forma de agir é justificável e ampara- se na lei, mas é profundamente injusta se o olhar for social e profissional no âmbito das competências que não guardam relação direta com gênero. Uma mudança na prerrogativa é difícil de ser executada, mas ajudaria a resolver o problema: Se a mulher ficasse em casa os três primeiros meses e o homem (pai de seu filho) ficasse em casa cuidando da criança os outros três meses, inclusive ficando responsável em levar a criança para amamentar no trabalho da mulher. Ambos estariam ausentes do trabalho pelo mesmo período. Essa ideia poderia minimizar a questão do mercado de trabalho, mas na prática necessitaria de uma mudança na cultura que só ocorrerá com educação voltada para as novas gerações e com mudança da lei, o que dependerá da participação da força feminina na política (o que ainda é numericamente insignificante para conseguir mudanças).
Convoco os pais a educarem seus filhos e filhas com um olhar de igualdade e respeito para que no futuro o mercado de trabalho valorize o profissional e sua capacidade sem considerar diferenças de gênero ofertando remuneração semelhante para atividades com as mesmas responsabilidades.
Para tal, a cultura precisa passar por transformações e isto leva tempo. A educação é viga mestra nesta transformação. Criar os filhos para respeitar as diferenças e valorizar o ser humano de forma geral sem desmerecer nenhum tipo de atividade exercida e sem mistificar coisas femininas e masculinas certamente é um dos caminhos para minimizar os sofrimentos gerados pelas atitudes desrespeitosas que muitas mulheres precisam enfrentar para consolidar sua vida profissional.